terça-feira, fevereiro 26, 2008

E se te matasse?

E se te matasse? Pela calada da noite, na paz aparente e podre desta casa. Deste bairro, desta cidade. Alguém me vai defender. Dizer que estou louca ou que me atacaste primeiro. Ou melhor ainda que me humilhaste tantas e tantas vezes que matar-te foi a conclusão lógica de tudo isto.
Hoje era um bom dia para morreres porque amanhã a empregada vem cá e sempre limpava melhor os vestígios do crime. Na televisão, os polícias bonitos ainda assim conseguem descobrir sempre. Mas isto aqui é só Portugal, é só Lisboa, num bairro condenado ao desprezo de todos. Aqui não entram polícias bonitos. Portanto não há que ter medo de te matar.
Pelo menos acabariam as minhas noites de insónia como esta. Em que tu ocupas a cama inteira e ressonas como um porco. Às vezes tenho nojo de ti. Pareces mesmo um porco rosado e anafado daqueles que se vendiam nas feiras da minha infância. Lá na terra, era assim os porcos bonitos e lustrosos vendíamos, os outros matávamos simplesmente. E era uma festa.
Matar-te será também como uma festa igual às desses dias. Será a minha liberdade. Porque finalmente poderei ser eu. E voltar à terra da minha infância, rever os abraços ternos da minha família, a qual me impediste de contactar desde que casámos.
E foi no dia do casamento que me apercebi que te queria matar, por isso sim, foi um crime premeditado. no qual eu já cumpri a minha pena antecipadamente. Agora posso finalmente matar-te. E sair em liberdade da prisão.

3 comentários:

Tanya disse...

Nem sei que dizer. É a primeira vez que visito o blog.

Está cheio de sentimento. Adoro a maneira comoo escreves.

Beijo.

intruso disse...

e se...
(os "ses" e os "talvez" e os "depois...")

[gostei de ler]

p.s.
volta sempre...
(eu voltarei)

Anónimo disse...

Misoginia, sim mas tão subtilmente intelectualizada (o que não quer dizer: falsificada, longe disso!...) e (como dizer?) "problematizada" que chega a arrepiar...