Senti de novo aquela violência a conquistar o espaço do meu corpo: as pernas a pontapearam o vazio, o ardor nos braços e depois de tudo a cegueira no olhar. no teu e no meu. Não sei se nos vemos quando disparamos um contra o outro . Sei que dói demasiado o embate. Sei que tenho imenso medo da minha força. De perder o controle do meu braço direito e de este não conseguir parar o movimento da jarra contra a tua face. Nunca como hoje esteve tão perto. Nunca como hoje estive tão longe de mim.
Passei anos a tentar esquecer que tenho essa violência bruta incrustada, que ela faz parte de uma herança genética que tento rejeitar diariamente. Passei anos a tentar acreditar em tudo o que outros escrevem em cartões de aniversário ou sussuram ao ouvido em noites quentes. Hoje, bastaste tu, os golpes desferidos e as palavras de crueldade de sempre, e num sopro de vento desmoronei-me. Como sempre e desde sempre.
Fica a ferida no lábio e no nariz. Fica o sangue. Ficam as tuas palavras que ecoam na minha cabeça como um disco riscado. Tenho medo de um dia vir a ser como tu.
1 comentário:
Este texto tocou-me profundamente. Está tão dentro das realidades mais duras...parabéns.
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