Olhá-lo e saber que é verdade. Estamos juntos e sós. Num quarto escondido do mundo. Sem saber como nem porquê, rimos ás gargalhadas; de nós e dos outros que observamos pela janela. Brindamos com copos de papel cheios de água à nossa solidão. Matamos todos os que pertencem ao mundo lá de fora. Aqui, só importa o agora. Agora, só nos importamos connosco. Não, não somos egoístas. Afinal, lá fora, quem é que se importou connosco?
Tantos ou tão poucos, que fomos condenados a esta solidão interior, de existir apenas neste aqui e neste agora. Daqui a pouco tempo morreremos. Vão-nos matar. Assassinar a alma e os pensamentos. Vai restar o corpo. Esse, eles, deixam para mim. Eles não podem matar o meu corpo. É crime, e eles são profissionais respeitáveis. Mas o que vai restar de mim, depois?
Agora, ainda tenho tudo. Tenho a consciência de que perdi tudo. A família, os amigos, o trabalho e que amanhã vou perdê-lo. Mas lutei, lutámos contra o inimigo escondido em cada esquina, em cada rosto que passava por nós na rua. Resisti enquanto pude. Mas esta não é uma batalha só minha... o meu tempo esgota-se. Acredito e quero acreditar até ao fim que algum dia tudo vai mudar.
Estou sozinha com ele. O meu corpo está junto ao dele, de tal forma que o oiço viver, em batidas tão coordenadas que me dá vontade de chorar. Penso que amanhã, ou depois, quando descobrirem este lugar, não vão haver lágrimas. Eles não as merecem. Só ele. Que cansado, adormeceu, encostado a mim. Vão-nos separar. Esse vai ser só o princípio de tudo. Angustiados e exaustos, iremos confessar coisas inimagináveis. Estaremos já mortos nesses instantes.
Morreremos pela Pátria. Sem honras ou futuras lembranças. Seremos apenas mais dois que amámos a liberdade mesmo quando ela ainda significa a nossa morte.
Foram apenas dois amantes, a quem não deixaram esperar por Abril...
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